sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Estou muito mais rica

Ontem tive a oportunidade de assistir a uma conferência sobre a eutanásia que teve como orador o Professor Pinto da Costa.

Ia com enormes expectativas pois seria a 1.ª vez que participaria numa sessão sobre este tema, que muito me diz, na qual iria ouvir argumentos a favor da eutanásia.

Quando cheguei, deparei-me com um participante numa cadeira de rodas e uma outra com uma grave doença degenerativa.

Confesso que fiquei algo tensa com a presença dos dois num evento em que se debateria um tema tão delicado. Afinal eram duas das situações que, para muitos, justificariam a morte a pedido e eu, que nunca vi ninguém pedir a morte, fiquei incomodada com aquilo que ali poderiam dizer.

Gostaria de conseguir descrever quão enriquecedora foi a experiência mas não há forma de o fazer. Só estando lá.

Depois de ouvir a brilhantíssima exposição do Professor Pinto da Costa, com o humor que se lhe conhece, e a partilha feita pela participante que sofre da tal doença degenerativa, reforcei as minhas convicções:

É necessário que cada um de nós, cidadão, procure esclarecer-se não só sobre o que realmente é a eutanásia como quais os motivos que, em regra, estão por trás da decisão de quem pede que lhe abreviem a vida.

Note-se que não está em causa prolongar a vida artificialmente e a qualquer custo, nem a defender o sofrimento. Bem pelo contrário.

Por vezes vemos pessoas sem qualquer tipo de problema físico que sofrem por não encontrar o sentido da vida.

Imaginemos então, alguém, com graves limitações físicas e que depende de terceiros. Como se sentirá se nós (sociedade e Estado) não tivermos mais para lhe oferecer do que olhares e palavras piedosas? Se fizermos a pessoa sentir-se um peso morto. Se não tivermos um gesto de afecto. Se não apoiarmos os seus cuidadores?

Como encontrará o sentido da sua vida?

É que é isto que se passa a maioria das vezes. Que vontade de viver terá esta pessoa? Nenhuma, logicamente. Vamos atender a essa vontade e seguir as nossas vidas normalmente? Será que a deficiência a torna a sua vida indigna ou menos valiosa que as nossas?

Não tenhamos ilusões, todos temos de morrer mas até lá temos o direito a viver plenamente, rodeados de afecto e conforto.

A questão é que muitas vezes (e pelas mais variadas razões) estamos demasiado centrados em nós e nos mais próximos. Não temos um segundo para os outros, nem para exigir condições para uma vida digna.

Fazemos manifestações contra o abate de árvores mas não dizemos uma palavra sobre a falta de uma rede de cuidados paliativos que apoie doentes e cuidadores, negando o direito a viver dignamente até ao fim.

Vão aos hospitais e vejam as condições dadas a quem se encontra no final da vida. Procurem informar-se sobre o suporte oferecido a cuidadores.

Temos políticos que concentram todas as suas forças em ser do contra, só por ser e não defendem a vida digna.

Deixamos que a vida seja vista na perspectiva económica, esquecendo que sem ela não há qualquer outro direito que possa ser defendido.

Nem me chocaria a defesa da eutanásia, se visse igual defesa de condições para uma vida digna até ao final. Se o Plano Nacional de Cuidados Paliativos fosse uma realidade e não um mero papel sem vida. Se estivéssemos todos mais atentos aos que nos rodeiam.

Não me chocaria pois tenho cada vez mais a certeza que se isso fosse uma realidade seriam ínfimos os desejos da morte como fim do sofrimento moral.


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