domingo, 1 de fevereiro de 2015

7 Vidas


- Como vai chamar-se a menina, perguntou o funcionário do registo civil?

- Vitória. Vitória de Fátima respondeu a avó, comovida.

Vitória não fora uma criança desejada e a mãe não de cansava de lho fazer sentir, parecendo retirar prazer ao contar todas as tentativas que fez para abortar.

Quis Deus que a pequena vingasse e se tornasse na mais bonita da aldeia, encantando com o seu porte elegante e os olhos verdes, espelhados, com pupilas verticais.

Quando tinha quinze anos foi acometida de febres altas que a faziam delirar e murmurar palavras imperceptíveis que soavam a miados de gato.



Com a avó sempre à cabeceira da cama a colocar-lhe  pachos de água fria na fronte, e quando já ninguém acreditava, o milagre aconteceu. Vitória sobreviveu, e mais uma vez sem mazelas.



Mais tarde foi a toxoplasmosque lhe trouxe insuportáveis dores musculares e de cabeça.

Os azares foram-se sucedendo ao longo da vida, fazendo aumentar os cotos de velas espalhados pela casa mesmo em frente às imagens dos santinhos de devoção da avó.

 

Por seis vezes esteve à morte e outras tantas dela escapou, como se lhe fosse superior.

 

Desta vez era um cancro que, apesar de metastizado por todo o corpo, não a impedia de percorrer a aldeia  a pedalar na velha pasteleira que fora do avô.

 

Atrás de si, sempre a uma distância suficiente para lhe dar liberdade ou atacar quem pudesse querer-lhe mal, seguia  uma gata persa cujos olhos se assemelhavam aos de um mocho inspirando respeito aos que se cruzavam com o bichano vindo ninguém sabe de onde.

 

Começou a correr o boato de que Vitória de Fátima tinha poderes sobre-humanos e de todos os lados chegavam pessoas em busca de inspiração e cura para os mais  variados males.

 

Vitória a todos ouvia, indecisa entre permitir que se mantivessem na ilusão de acreditar naquilo que a eles dava vida ou explicar-lhe que, tendo nascido no dia 4 de Outubro, dia de S. Francisco de Assis (santo protector dos animais) tinha tão somente a sorte de poder partilhar as 7 vidas daquela gata que inexplicavelmente a seguia.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Obrigada por dar vida a este blog.

Desta vez sim, estou livre do IPO

 Depois da onco-hematologista me ter dado alta do IPO, foi a vez da nefrologista o fazer (ainda que com indicação de ser seguida em consulta...