quinta-feira, 9 de maio de 2019

Humans of Aveiro

Há dias fui surpreendida por uma amiga que me propôs como possível entrevista no projecto Humans of Aveiro, um projecto fotográfico com anónimos da cidade.
Aceitei o desafio e partilho-o agora neste meu cantinho pois, mesmo sabendo ue muitos de vocês já leram, tenho de clarificar dois pontos e sossegar a chata da minha irmã do meio:

- Não tenho 40 anos, estou nos 40 ☺️
- As minhas causas não são  obviamente o aborto e a eutanásia, como uma leitura mais diagonal e a minha falta de clareza possam fazer parecer. Bem pelo contrário, defendo que a vida tem de ser defendida do início ao fim e que a sociedade ( entidades e cidadãos comuns) têm de assumir as suas responsabilidades para que a dignidade da vida seja uma realidade.

Posto isto, resta-me agradecer os muitos comentários carinhosos recebidos na sequência da partilha da minha história de vida que me deixaram de coração cheio, apesar do manifesto exagero de alguns (os Amigos são sempre exagerados, parece-me.

Deixo o texto, para quem não navega pelos mares do Facebook.


Ontem estive com uma pessoa que é uma lição de vida, inspiradora, resiliente, há exemplos que deviam chegar a todos. Assim nos chegou a Susana Neves:

"Sou a neta e filha mais velha, de uma família quase perfeita (se é que a perfeição existe). Uma menina cheia de mimo, portanto.
Gosto de pessoas e coisas simples. Dou tudo por uma boa conversa com amigos, preferencialmente à volta de uma mesa. No meu dia ideal não existiriam relógios. Chateia-me muito o tempo contado.
Gosto da segurança e maturidade que se sente aos 40 anos. Poder dizer sem vergonha, por exemplo, que escolhi seguir a área de Direito por gostar muito de escrever e dos 1001 sentidos que se podem retirar de uma frase e, em parte, inspirada nos muitos livros que li em que o Perry Mason era a personagem principal.
Até dada altura, a vida correu como sempre planeei. Entrei no curso que escolhi; casei aos 30 anos, como decidi; engravidei à 1.ª tentativa.
Tudo corria às mil maravilhas, até que às 19 semanas de gravidez me foi diagnosticado um linfoma de Hodgkin.
Receber uma notícia destas em plena gravidez é algo avassalador. Faz-nos questionar tudo e perceber que não somos nada. Felizmente tudo correu bem e tenho a Leonor prestes a fazer 10 anos e a Benedita, gerada 6 meses após a quimio, que são o meu orgulho.
O cancro reforçou em mim a convicção de que nada acontece por acaso e há que procurar o sentido de tudo aquilo que nos acontece na vida.
Posso dizer que há uma Susana antes e outra depois do cancro e que, apesar de toda a dor, sou imensamente mais feliz agora porque valorizo cada segundo do dia, esteja sol ou vento.
Já antes me tinha envolvido em iniciativas de apoio à vida mas depois do diagnóstico encarei a sua defesa como uma das minhas prioridades.
O aborto e a eutanásia, em particular as condições sociais que entendo deverem existir para que a vida seja do início ao fim a opção, são causas a que me dedico de corpo e alma.
Entretanto redescobri o gosto pela escrita e vou fazendo do meu blogue, Hodgkin, Logo Existo, uma espécie de diário no qual partilho o que me vai na alma a cada momento.
Não tenho outras ambições para além da de continuar a ser feliz, junto da minha família e amigos.

Sou neta de alentejanos e fui a 1.ª da família a nascer cá. O meu avô, Emílio Matos, era professor de piano e esteve ligado ao início do Conservatório em Aveiro.
Sou apaixonada por esta cidade que acolheu tão bem a minha família que até o meu pai, sem qualquer ligação à cidade, acabou por ter o sonho de vir para cá viver após a reforma sonho que, entretanto, já realizou.
Vivi cá até aos 5 anos e regressei aos 23, quando acabei o curso e decidi que era em Aveiro que queria construir o meu futuro.
Nesse entretanto, lembro-me de vir para Aveiro no 1.º dia das férias de verão e só regressar a casa no final dos 3 meses.
Aveiro é a cidade perfeita para viver. Desde o mar à montanha, temos de tudo a dois passos. Um dos locais que mais me marcou foi o velhinho estádio Mário Duarte onde passei muitas tardes de domingo a vibrar pelo Beira-Mar.
Marcou-me também a praceta no Bairro do Liceu, onde passei parte da infância.

A Sé (onde fui batizada) e o museu de Santa Joana. Gosto muito de preservar memórias e tradições. Sem conhecer e respeitar o passado dificilmente compreendemos o presente e conseguimos criar uma marca identitária e estes locais têm o condão de o permitirem, por estarem ligados à história de Aveiro.
Se tivesse de dizer alguma coisa ao mundo o que seria?
Há uma frase que ouvi há anos que resume muito do que gostaria de dizer ao mundo,” Ninguém é uma ilha de si próprio”. Precisamos todos uns dos outros. Somos tão pequenos, e a vida tão volátil, que não devemos perder tempo com brigas e outras parvoíces.
Cada segundo é precioso e deve ser vivido com intensidade. E partilhem. Se não tiverem nada mais nada, partilhem tempo, doem medula óssea. Há sempre tanto que podemos fazer."

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