sábado, 9 de junho de 2012

21 de Janeiro de 2009

Perguntam-me, frequentemente, como foi viver a gravidez, sabendo ter cancro. Nunca sei como nem o que responder. Na verdade, há muitas coisas que só percebo à distância. Hoje resolvi partilhar uma das páginas do diário que fui escrevendo. Há coisas que senti que nunca me permiti, sequer, escrever. Agora, ao ler o diário, percebo muita coisa que o cérebro foi mascarando. A partilha é uma espécie de terapia. Não me perguntem porquê, mas a minha reacção foi sempre a de falar sobre o cancro. Ao olhar para a minhas crias tudo parece mentira. Estão lindas e saudáveis e têm a mãe com elas, para as amassar com beijos. E eu tinha razão, a Leonor tem cá uma personalidade ..... "Minha querida Leonor, estou ansiosa por te ter nos braços, apesar de estar deliciada com a gravidez. Não fora o "precalço" que me foi detectado, e uma tendinite horrível no ombro direito, e seria tudo um mar de rosas. Tenho uma vaidade imensa na minha barriga. O avô Fernando chama-te "Lianor", na brincadeira. Se for como era comigo, e com as tias Dulce e Joana, há-de arranjar-te uma série de alcunhas. Ainda não te disse mas quando saí da ecografia morfológica (no dia 7) dei comigo a cantar "morena de Angola que traz o chocalho agarrado na canela". É de um CDdo Chico Buarque que a tia Dulce ofereceu ao papá nos anos. Não sei com quem te vais parecer. Só sei que sinto que vais ter uma personalidade muito forte. Aquilo que me tens feito sentir, a força que me transmite (sempre nos momentos mais complicados)é indescritível. Sou uma privilegiada, acho que nunca ninguém terá contigo uma relação tão íntima e forte como aquela que eu tenho. Quando estava a fazer a eco, a médica disse-me "quem sabe esta bebé não veio para a ajudar?". Estava a referir-se ao linfoma e à questão da criopreservação das células estaminais. Ainda não coloquei em questão a minha capacidade para ser uma boa mãe, talvez seja falta de modéstia, não sei. Só sei que tenho um Amor infinito por ti e o meu único medo é não ter saúde para te acompanhar. Embora não o queira transmitir, sabes que tenho medo, apesar de não me sentir revoltada. Vejo tantas pessoas doentes à minha volta. É assustador. Enfim, mas tenho de ter fé. E depois, aconteça o que acontecer, há muitas pessoas que te amam e cuidarão de ti".

3 comentários:

  1. Olá! Parabéns pelo blogue! Acredito que os nossos filhos nos escolhem para crescerem connosco mas também para nós crescermos com eles. É muito bom quando nos apercebemos disso e não o tememos! Um abraço de mãe para mãe!

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Obrigada por dar vida a este blog.

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